A NOIVA DO MAR
A Noiva do Mar
Luzia ainda era uma menina quando se encantou por João da Silva
Filho.
"João da Silva Filho"... Ela achava lindo esse nome e quando estava
em casa sempre arranjava um jeito de comentando sobre os pescadores
com a avó, dizer: - sabe vó, hoje cedinho eu vi a embarcação do João
da Silva Filho apontando lá por trás da pedra grande. Eita que
aquele barco do João da Silva Filho é bem bonito!
A avó já esbranquiçada cabelos e veias achava graça do jeito da
neta e lhe dizia: Luzia, Luzia... João é muito velho procê! Devia se
meter com os da tua idade: Jeremias, Robson...
- Qué isso vó! Ele é só quatro anos mais velho que eu! E a senhora
tá caducando se acha que vou dar trela pra esses garotos que nem
nome bonito tem. Eu amo João vó! E um dia ele vai me amar também. A
senhora há de ver!
João gostava da moça, mas como a avó era severa, ficava ressabiado
de falar de amor com Luzia e então, ficava tudo na amizade
mesmo.
E assim se passaram dois anos; Luzia suspirando... João
receando...
Até que, o pai do João, cansado de ver aqueles dois, um olhando no
olho amoroso do outro sem nada dizer, foi ter com a velha. Acertaram
deles dois se conhecerem melhor pra ver se tinha futuro.
E numa festa na pracinha do lugar, todo mundo viu João e Luzia de
mãos entrelaçadas, conversando baixinho... Desse jeito mesmo dos
apaixonados, quando querem manter o resto do mundo bem longe.
E passado mais um ano, o casamento estava marcado.
Luzia fazendo seu vestido de noiva, João querendo pescar todos os
peixes do mundo!
Quando não se costurava, nem se pescava, era na praia que se
encontravam. Falavam da vida de casados, de filhos... Faziam
planos... Ou só ficavam ali, juntinhos sem nada dizer. Ás vezes,
quando Luzia, sentada na pedra grande, se distraída olhando o mar,
João sussurrava em seu ouvido: - Tira teus olhos do mar Luzia!
Se ele cisma, rouba de mim teu coração e te leva pra nunca mais
voltar!
- Luzia sorria. Amar João era seu destino. Tão certo como o ir e
vir das ondas. Não tinha maior felicidade no mundo que aquela de
ficar de mão dada, beirando a praia, chutando areia ao lado de João.
João da Silva Filho que ia voltar para o mar.
Foi isso que ele lhe disse, já na porta da casa de sua avó.
- Como assim...? Vai de novo pro mar? - Disse Luzia irritada - Você
acabou de voltar João. Tem graça não.
- Eu sei, mas meu pai precisa de mim... Jó tá doente Luzia. Eu ia
dizer o que? Olha só... Vai ser bom ganhar mais um dinheiro! Pensa
bem: juntando com o das tuas costuras, faremos uma bela festa de
casamento e ainda sobra para nossa Lua de Mel. Eita... Bom
demais!
E lá se foi João sumindo em meio às ondas.
Dois dias depois, com a manhã ainda despontando no céu, a avó de
Luzia, arrastando chinelas, acorda a menina dizendo - tive em sonho,
um aviso: o tempo vai virar.
Luzia, acostumada com as crendices da avó, abre a janela e vendo o
sol surgindo diz: - Vai não vó. Olha esse céu! Puro fogo de tão
vermelho. E o pai de João me garantiu que é tempo firme toda essa
semana. João volta daqui a dois dias. O pai de João nunca erra no
tempo. A senhora sabe disso!
- Sei não menina... Sei não... Melhor acender uma vela, e pedir
proteção.
Luzia foi fazer o que a avó lhe disse, só para agradar. Mas sentiu
um arrepio de medo, quando o vento sorrateiro apagou a vela.
Contrariada consigo mesma, pensou: - Ah, tô ficando caduca igual a
vó! Eu hein! Olha o céu azulzinho! O mar tão mansinho... Vai virar
tempo nenhum!
No dia seguinte, ao acordar, Luzia deu de cara com o mar refletindo
um céu carregado. Tudo era negrume e vento. Não demorou muito e o
mar se agigantou.
Passaram-se quinze dias. João não voltou. Luzia era só dor e
loucura: - João volta, volta sim. Tempo não vira, não vira...
Sua vó não sabia o que fazer. Ninguém sabia. Luzia parecia ir
morrendo aos poucos com o passar dos dias. Dias que Luzia vivia na
praia. Ia cedo. Seus olhos vasculhando as águas, a boca sussurrando
coisas ao vento, enquanto se lembrava de João lhe dizendo: tira teus
olhos do mar Luzia! Tira os olhos do mar...
Luzia empalidece e pensa: - Se o mar levou meu João, meu João agora
é o mar. É isso! João agora é o mar De repente Luzia se põe a andar
de volta pra casa apressada. Segue beirando a praia, ouvindo em sua
loucura a voz de João vindo da arrebentação: - Vem Luzia, vem pro
teu João teu João agora é mar... Vem!
Uma Luzia febril e ofegante, pega o véu do seu vestido de noiva,
olha para a avó que ainda dorme e volta para a praia. Sobe na pedra
grande, estendendo o véu ao vento.
- Olha João, olha! Não ficou bonito meu véu? Não te mostro o
vestido para não dar azar. E perdida nas lembranças, Luzia
delirantemente feliz, dança sobre a pedra olhando para aquele céu de
fogo, dizendo: - Vê João? O céu vermelhinho. Hoje o tempo não vira!
O tempo não vira! Não vira nunca mais!
- Então vem Luzia, vem pra teu João!
Luzia se volta para as ondas que arrebentam de encontro a grande
pedra. Ali parada o olhar alargando pelo mar adentro...
- Vou João, me abre teus braços, me acolhe em teu peito, que a
saudade que sinto, é maior que o oceano.
terça-feira, agosto 08, 2017
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Tania Salgueiro 2017- Todos os Direitos Reservados
3 comentários:
É o infinito bafejando na alma... Muito bonito o texto !
Querida Vera Menezes, que alegria saber que gostou! Muito obrigada!
lindo demais, emocionante como voce contando e cantando
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